sábado, fevereiro 25, 2006

Carnaval: a festa, o vale-tudo, 01 semana de utopia


Sabemos que o carnaval é definido como “liberdade” e como possibilidade de viver uma ausência fantasiosa e utópica de miséria, trabalho, obrigações, pecado e deveres. Numa palavra, trata-se de um momento onde se pode deixar de viver a vida como fardo e castigo. É, no fundo, a oportunidade de fazer tudo ao contrário: viver e ter uma experiência do mundo como excesso – mas agora como excesso de prazer, de riqueza (ou de “luxo”, como se fala no Rio de Janeiro), de alegria, de riso; de prazer sensual que fica – finalmente – ao alcance de todos.

Matta, Roberto da. “O que faz o brasil, Brasil?”. Rio de Janeiro: Rocco, 2001. p.73

Este sentido de “pode tudo”, que segue mais ou menos a lógica do “jeitinho” no dia-a-dia ganha força neste período carnavalesco. Como se fosse uma catarse coletiva há uma euforia no ar – mesmo de quem está distante da chamada folia. Não à toa o ano no florão da América começa pra valer depois da festa de Momo. Não se trata uma festa... É a FESTA.

Sai o uniforme, entra a fantasia; Saem 08 horas de trabalho, entram 08 horas atrás do trio elétrico, do frevo, das escolas de samba. Tudo pelo prazer, tudo pela sensação de liberdade que a maior festa popular do mundo oferece.

Neste mundo de prazer e alegria, todos os outros assuntos ficam em segundo plano. Sob a justificativa do bordão “É carnaval!”, fatos importantes ou relevantes são deixados de lado. Ou mesmo o que acontece ao lado do folião é desprezado, esquecido.

O carnaval de Salvador recebe o título de “maior festa com participação popular do mundo”. Este ano, estima-se, são 2 milhões de foliões atrás dos trios elétricos de seus artistas preferidos ou não. Mas o Carnaval por estes lados está menos soteropolitano e mais “pra inglês ver”. Ou irlandês. O antigo folião pipoca, aquele que não saía em blocos com abadas ou não comprava seu acesso a camarotes, está em vias de extinção. O espaço para a “pipoca” foi loteado: no carnaval baiano, agora, só com abada ou camarote. Ainda há a participação popular nos blocos menores, mas estes não saem durante o Jornal Nacional, por exemplo. Outro aspecto que merece atenção é a violência policial utilizada, claro, nos “ppp’s”: Pretos, pobres, periféricos. Assistindo a cobertura do Carnaval pela TV tudo é muito bonito e democrático. E é só festa e alegria.

Bebês encontrados no lixo e em lagoas, exploração sexual de crianças e adolescentes que aumenta durante este período, hospitais lotados com pacientes que extrapolam na festa e arrumam confusões ou por bebedeira, acidentes de trânsito que a cada ano batem recordes, tanto nas cidades como nas estradas... Todos estes assuntos são relegados a segundo, terceiro plano. O negócio é a folia, a festa, o vale-tudo, a todo e qualquer custo... Mesmo que o custo seja um abadá comprado por 3 mil reais ou o aluguel de uma quitinete por módicos 4 mil reais por 4 dias.

Não pretendo tornar este texto algo negativista ou conservador. Não é a intenção. Carnaval é mesmo uma grande festa e há diversão para todo gosto e bolso. Mas viver 1 semana distante do “mundo chato e uniforme” também não é boa idéia: Mais um bebê é encontrado no lixo em SP. Mesmo com toda as festividades ocorrendo no país, não dá pra desprezar isso.

Ou já é coisa banal?
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Bono Vox cantando axé music no Carnaval da Bahia num dueto com Ivete Sangalo! Depois desta, não duvido mais de ET's, Mula sem cabeça e promessa de políticos!
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Alguns "artistas" do carnaval baiano ficaram "frustrados" porque Bono Vox se mandou e não deu a esperada "canja" no trio elétrico do "ministro" Gil. Também, cadê o cachê, "ministro"????
Jaime Guimarães, co-responsável por este blog, postou estas mal-digitadas mesmo sabendo que quase ninguém vai ler: afinal, quem se importa com blogs e jornais neste período do ano?Mas recomenda, aos interessados, o bom livro do antropólogo Roberto DaMatta.

quarta-feira, fevereiro 15, 2006

O CENTÉSIMO MACACO


Estamos engatinhando e sinto que é chegada a hora de explicitar a proposta inicial deste Blog, até para que mais pessoas dele participem, interajam e sintam-se parte daquilo que pretendemos fazer.

Ao invés de desenvolver textos que expliquem o nascimento da idéia, resolvi publicar o texto que fez parte da Edição Zero, da Revista Aldeia, nos idos de novembro de 1999....e era um desses projetos utópicos que ficam no meio do caminho.

A revista era impressa, falava de ecologia e qualidade de vida....era bem legal mas não durou mais do que 3 edições. Falta de grana e patrocínio. Mas não vamos falar de coisas tristes, não é mesmo ?

Voltemos ao texto....quem sabe isso não dê um tranco nesse Projeto ou mesmo na participação de nosso leitores. Aí vai....o texto é meu mesmo:

Há muito tempo li um livro com o curioso nome de “O Centésimo Macaco”, e quando sentei para escrever esse texto de encerramento de nossa primeira revista, número zero, ele imediatamente me veio à mente. Foi irresistível...sequer pude imaginar outra abordagem para essa página.

Pois bem! Comprei o tal livro no começo de 1991, intrigado com o título, e com o subtítulo de capa (O Despertar da Consciência Ecológica). Foi escrito por Ken Keyes Jr e lançado no Brasil pela Editora Pensamento. De cara uma surpresa: não tinha direitos autorais reservados, pois tanto o autor quanto a editora desejavam que seu conteúdo tivesse a máxima divulgação possível. Foi escrito no contexto de perigo iminente de guerras e desastres nucleares (1981).

Desde então tenho sido uma espécie de porta-voz do autor e do próprio conteúdo do livro. Apesar de estarmos vivendo outros tempos, é certo que ainda não estamos livres do perigo nuclear (basta ver navios transportando plutônio por nossos mares) e, por isso mesmo, seu conteúdo ainda é atual.

Mais do que o conteúdo, entretanto, está a constatação do autor, tão simples que pode ser resumida numa simples frase: estamos todos no mesmo barco e se não houver mais barco não estaremos mais! A prática da ação ecológica e, antes de tudo, prática de cooperação, e se não fizermos nossa parte ninguém o fará por nós.

Nossa revista propõe-se a fazer sua parte, falando de ecologia e de qualidade de vida. E se um número suficiente de pessoas se tornar consciente de algo, nossa esperança é de que essa consciência se estenda a todos, como no fenômeno do centésimo macaco, que passo a relatar:

O macaco japonês Macaca Fuscata vem sendo observado há muito tempo em estado natural. Em 1952, os cientistas jogaram batatas-doces cruas nas praias da ilha de Kochima para os macacos. Eles apreciaram o sabor das batatas-doces, mas acharam desagradável o da areia. Uma fêmea de um ano e meio, chamada Imo, descobriu que lavar as batatas num rio próximo resolvia o problema. E ensinou o truque à sua mãe. Seus companheiros também aprenderam a novidade e a ensinaram às respectivas mães. Aos olhos dos cientistas, essa inovação cultural foi gradualmente assimilada por vários macacos. Entre 1952 e 1958, todos os macacos jovens aprenderam a lavar a areia das batatas-doces para torná-las mais gostosas. Só os adultos que imitaram os filhos aprenderam esse avanço social. Outros adultos continuaram comendo batata-doce com areia.

Foi então que aconteceu uma coisa surpreendente. No outono de 1958, na ilha de Kochima, alguns macacos – não se sabe ao certo quantos – lavavam batatas-doces. Vamos supor que, um dia, ao nascer do sol, noventa e nove macacos da ilha de Kochima já tivessem aprendido a lavar as batatas. Vamos continuar supondo que, ainda nessa manhã, um centésimo macaco também tivesse feito uso dessa prática. ENTÃO ACONTECEU!

Nessa tarde, quase todo o bando já lavava as batatas-doces antes de comer. O acréscimo de energia desse centésimo macaco rompeu, de alguma forma, uma barreira ideológica! Mas veja só: os cientistas observaram uma coisa surpreendente: o hábito de lavar as batatas-doces havia atravessado o mar. Bandos de macacos de outras ilhas, além dos grupos do continente, em Takasakiyama, também começaram a lavar suas batatas-doces! Assim, quando um certo número crítico atinge a consciência, essa nova consciência pode ser comunicada de uma mente a outra
.’ (O Centésimo Macaco, Ken Keyes Jr., Editora Pensamento).

Algum dia, espero, atingiremos a massa crítica de consciência ecológica que irá detonar uma grande mudança de comportamento em nosso Planeta. Meu único temor é o de que isso aconteça tarde demais. Enquanto isso, o que temos a fazer é lavar nossas batatas..e não esquecer de contar para os outros porque estamos lavando.”

Era isso que eu queria dizer a todos nós....vamos em frente, fazendo Massa Crítica!

Daniel Bykoff, é co-responsável por esse Blog e lava suas batatas da areia antes de comê-las.

quinta-feira, fevereiro 02, 2006

VIDA FORA DE CONTROLE

Parece que agora nos perdemos mesmo.

Leio os jornais e, dia após dia, encontro notícias de assassinatos, crueldades de toda a sorte, desumanidade, todas praticadas contra crianças de poucos dias, meses ou anos de vida.

Estou chocado. Primeiro a menina encontrada boiando num lago em BH (salva); depois outra criança jogada num canal no RS (morta); mais uma deixada debaixo de um carro (também salva); outra espancada até a morte em BH; e mais uma de 11 meses (gente, 11 meses!!!), chutada de seu andador, caiu da escada, teve sérios ferimentos e o agressor, companheiro da mãe, pediu para não importuná-la porque ela estava chorosa.

Tive já alguns choques nessa vida, alguns de ordem pessoal (3 abortos que antecederam a vinda da minha amada filha Rafaela), outros nem tanto, mas que certamente refletiram na minha visão do mundo (quando vi crianças prontas para morrer, quer na África, de fome, quer nas Casas de Morte chinesas, vítimas de um controle de natalidade imbecil).

Mas parece que quebramos o sétimo selo agora. Atentar contra a vida de uma criança não me parece que possa ser explicado por fatores ambientais, sociológicos, culturais, antropológicos ou o que quer que se possa dizer. É simplesmente a negação da humanidade.

Dirão alguns que são as exceções .... casos extremos que sempre foram encontrados na história da civilização. E se sempre existiram significa que não estamos tão fora de controle assim.

Mas a morte, o abandono, o descaso com crianças não amadas, vindos de pais e mães também não amados, para mim é mais do que um padrão de exceção. Ele é um verdadeiro sinal....de que estamos à deriva em nossa Humanidade.

Se ainda nos chocamos com isso, e se não conseguimos passar bem esses dias, ao tomar conhecimento desses 4 ou 5 casos pontuais acima, como justificar nosso esquecimento da fome das crianças africanas, ou da desumanidade a que estão expostas as crianças chinesas ?

O que estamos fazendo para acabar com isso ?

O que fazer ? E como ?

Porque o quando já passou faz tempo....

Daniel Bykoff, co-responsável por esse Blog, que hoje vê urgência em tudo.