terça-feira, outubro 04, 2005



DESARMEM A IMPRENSA!

Depois de um período dedicado a mensalões e esquemas espúrios no planalto, a discussão sobre o referendo do dia 23 de Outubro para definir a favor ou contra o desarmamento chega às ruas e ao cidadão comum.

O cidadão tem o direito de votar como manda sua consciência. Essa é a prerrogativa inicial de uma sociedade democrática. Durante as conversas familiares pode-se haver discussões e debates entre os membros da casa sobre o referendo e isso é válido e salutar, principalmente após a propaganda que já é exibida na TV e emissoras de rádio (mesmo que uma das frentes, a que apóia o desarmamento, utilize-se de “atores globais” para o convencimento do cidadão).

A imprensa tem um papel fundamental no referendo. Informar seus leitores, seus telespectadores, seus ouvintes, seus internautas sem tomar partido por “A” ou “B” é o que se chama de bom jornalismo: Informar, sem manipular.

Neste ponto, é frustrante verificar como dois dos maiores veículos de informação e comunicação do Brasil tem comportado frente ao referendo. A revista VEJA, que ostenta ainda o título de revista séria e “indispensável”, na sua edição de número 1925 de 05 de Outubro de 2005 tomou partido pelo “não ao desarmamento” e estampou na capa as “7 razões para votar não”. A “reportagem”, se assim podemos chamá-la, é digna de um panfleto para os grupos favoráveis ao direito de portar e comprar uma arma. Como a capa já demonstra, o conteúdo da matéria é tendencioso e tenta direcionar a escolha do leitor para a causa defendida pela revista. Em nenhum momento analisou-se o que a proibição da compra e do porte de armas poderia trazer de positivo para o país – afinal, esta é também a função do jornalismo: mostrar os dois lados da questão.

A revista VEJA há muito deixou de transmitir credibilidade. Uma revista que já comparou Che Guevara a Bin Laden e Fernando Collor a Lula, distorce a notícia (para lembrar um caso recente, uma manifestação contra a corrupção no Rio Grande do Sul transformou-se em manifestação contra o governo Lula, com a foto de uma garota representada como cara-pintada dos tempos modernos exigindo o impeachment do presidente Lula) e fomenta valores de consumo fúteis não pode ser levada a sério – inclusive por manter um colunista (Diogo Mainardi) que tenta ser polêmico como Paulo Francis (obviamente, um insulto a mestre Francis).

Já a Rede Globo de TV é mais sutil. Mas não passa incólume. Na edição do Jornal Nacional desta segunda-feira 03 de Outubro foi exibida reportagem sobre pesquisa revelando que criminosos usam armas legais, ou seja, armas que estiveram nas mãos dos chamados cidadãos de bem e que foram parar nas mãos dos bandidos. Logo depois, na edição da reportagem, aparece a governadora do Rio de Janeiro, Dona Rosinha Matheus declarando-se favorável ao desarmamento.

Não cabe discutir aqui a metodologia da pesquisa e suas conclusões, e sim o contexto em que a reportagem do Jornal Nacional foi exibida. Ao final da propaganda obrigatória sobre o referendo, volta o jornal com a reportagem sobre a briga envolvendo policiais militares e torcedores do Internacional no estádio Beira-Rio, em Porto Alegre. As imagens, de fato, são chocantes: policiais com espingardas atirando em torcedores gaúchos e pessoas feridas. A imagem de uma criança protegida pelo pai é frisada. A ênfase da reportagem é dada ao procedimento da PM que utilizou armas para conter uma confusão entre torcedores. Logo depois entra a tal reportagem sobre a pesquisa mencionada.

De forma sutil, a Rede Globo tenta manipular a escolha do cidadão. O enfoque das reportagens exibidas é claramente tendencioso, culminando com a fala da governadora do Rio de Janeiro que se declara a favor do desarmamento. Exatamente após a propaganda do referendo, o telejornal mais assistido do país (lembrando que a Rede Globo chega a mais de 99,8% do território e da população brasileiros) exibe duas reportagens sobre armas e violência, e com o argumento utilizado na propaganda dos favoráveis à proibição da venda e porte de armas de fogo: a arma do cidadão de bem pode parar nas mãos dos bandidos.

Todos sabem que a informação no Brasil é controlada por meia dúzia de grupos. E cada grupo tem sua ideologia que tenta impor à massa (a revista VEJA, por exemplo, não perdeu sua oportunidade de tirar sua “casquinha” do MST). O que VEJA e Rede Globo estão fazendo não é jornalismo. É manipulação e atenta contra a ética jornalística, desprezando o compromisso de informar aos cidadãos os dois lados da moeda e visa somente atender aos interesses de seus grupos políticos e empresariais.

O que eles não esperavam e não contavam era que a Internet vem democratizando o acesso à informação.Aos poucos, mas o suficiente para incomodar. Grandes e pequenas intervenções. É isso o que esta Massa Crítica propõe: incomodar. Engatinhando, ainda, mas evoluindo.

Jaime Guimarães é míope, mas não gosta de ser feito de bobo.