segunda-feira, outubro 03, 2005

Um gato e a morte

Pois é. Fazer massa crítica é um trabalho que demanda superação. É tentar encontrar uma nuance, um enfoque diferente e uma nova forma de abordagem de temas que, de tão surrados e já esmiuçados, não nos tocam mais.

Emocionar-se, então? Nem pensar ... Patrulhas diversas nos impedem de manifestar um pouco de humanidade neste mundo tão carente de demonstrações explícitas de carinho, compreensão, piedade ou quaisquer outros sentimentos rotulados de piegas.

Li que na Flórida alguém desviou de um gato e matou um jovem que estava sentado no meio fio, com seu skate na mão. A matéria limitou-se a narrar o acontecimento e a eximir o motorista de culpa porque o menino estava com metade do corpo na rua (como se isso fosse uma sentença de morte).

Logo alguém vai transformar essa notícia em piada, ou algum trocadilho. O fato é comum, é certo...prosaico até. Mas, caramba ...alguém vai se colocar na pele desse motorista que acabou de matar um jovem ? Alguém vai pensar, por um momento que seja, nos planos de uma vida que acabou de sumir instantaneamente para que um gato pudesse sobreviver (nada contra o bichinho)? Numa namorada que esperou uma ligação, que não veio? Numa família que preparava uma viagem de fim de ano? Sei....tudo isso é piegas...

E quanto ao motorista? Que impacto uma morte provocada por motivo banal vai lhe trazer ? Vai fazer análise ? Vai entregar-se a algum vício ? Vai enxergar o jovem morto em todos os jovens que passarem-lhe pela frente ?

Quantas vidas há numa tragédia...e quanta tragédia pode surgir de um acidente de carro (que na verdade mata mais do que armas de fogo, é bom que se diga....).

Mas essa reflexão só é possível num momento de fraqueza. Logo alguém chega e te diz, deixa de frescura, tem gente morrendo de fome: deixa de ser frouxo, pensa na tua vida; deixa de ser pisciano, você não pode resolver os problemas do mundo; deixa de ser maluco e pensa em alguma coisa produtiva.

Fica o registro, o pensamento e o carinho dedicado a todos os atores dessa tragédia. Tentar entender o masterplan de tudo isso é realmente pirante. Daí porque estou com Lobão: “Vida louca, vida breve....Já que eu não posso te levar, quero que você me leve.”
Daniel Bykoff, apenas um cidadão do mundo